Açúcar

Ricardo Oliveira
Nutricionsita

Durante milhões de anos a natureza seleccionou o melhor que há em nós. O resultado foi perfeito mas não bastava e o Homem não resistiu à tentação de utilizar o fogo na cozedura dos alimentos. Estes tornavam-se mais saborosos e a biodisponibilidade da maioria dos nutrientes presentes nos alimentos era superior, o suficiente para o cérebro desenvolver-se de uma forma inigualável. A partir daí seguiram-se anos de boa culinária, descobertas e invenções, do churrasco em calor seco evoluiu-se para os utensílios e loiças próprios para a cozedura de alimentos em calor húmido. A espetada madeirense sem sal e manteiga é tipicamente pré-histórica mas na realidade tão saborosa na era pré-agrícola como seria hoje. Após a revolução alimentar e a introdução maciça do sal, açúcar e gordura de adição, poucos consideram a espetada regional sem sal e manteiga saborosa. O paradigma das novas tecnologias da produção alimentar deve-se ao facto do sucesso comercial de um alimento estar dependente do sabor doce, salgado ou gorduroso, uma vez que inicialmente estes ingredientes aumentam a sua desejabilidade pelo valor social e psicológico associado, melhoram a apresentação final do produto e aumentam o tempo de conservação.
Dizem alguns entendidos nesta matéria que o nosso primeiro erro foi descobrir o açúcar. Este ingrediente na sua forma refinada tem uma absorção tão rápida no organismo que engana os “velhos” e perfeitos mecanismos de saciedade e induz uma sensação de fome precoce. Como imagina, uma a duas horas após a sua ingestão surge uma descida do nível de açúcar no sangue (hipoglicemia) que consequentemente estimula a ingestão de mais açúcar e instala-se um processo cíclico. A apetência para gostarmos de açúcar é inata, uma vez que a natureza providenciou-nos de papilas gustativas bem na ponta da língua de forma a não recusarmos o leite materno. Por outro lado a ingestão de açúcar estimula a produção de serotonina, que é responsável em parte pela sensação de bem-estar.
As experiências com ratos permitem constatar que ao privá-los de alimentos por um período longo, o consumo da sua refeição normal de sementes cresce 120% e se adicionarmos açúcar à refeição cresce 140% ou se a substituirmos por apenas açúcar sobe até 200%. O exemplo do “rato de cafetaria” como é conhecido entre os estudiosos do comportamento alimentar é uma analogia ao dia-a-dia do funcionário que após meia dúzia de horas acorrentado ao serviço lhe é dado a escolher no café mais próximo uma mão cheia de ofertas calóricas que vão desde o chocolate até à sandes de pão-de-leite com manteiga e queijo. Este tipo de oferta tem a agravante de oferecer para além do açúcar, uma quantidade apreciável de gordura. Mesmo para o consumidor que despreza a gordura de adição, a quantidade de gordura invisível presente na maioria dos chocolates e produtos de pastelaria, bolachas, gelados, etc, aumenta o valor calórico e desequilibra o dia alimentar. Desta forma, o consumidor não procurou intencionalmente gordura na refeição mas sem se aperceber a partir dos alimentos doces consumiu uma porção superior de gordura. O mesmo exercício poderia ser feito com o sal para concluirmos que uma alimentação que privilegia os açúcares fomenta igualmente a ingestão de gordura e sal.

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